terça-feira, 24 de dezembro de 2019

Chantons Noel


Chantons Noel. Ghosts of Christmas Past (Les Disques du Crépuscule, 1981)




Ghosts of Christmas Past (Remake) (Les Disques du Crépuscule, 1982)




Merry Christmas (Les Disques du Crépuscule, 1984)




Ghosts of Christmas Past (Les Disques du Crépuscule, 1986)



















domingo, 17 de novembro de 2019

domingo, 10 de novembro de 2019

Joaquim Manuel Magalhães

Acendimento

Seria bom sentir no quarto qualquer música
enquanto nos banham os perfis ateados
pelo aroma da tília, sem voz, em abandono.
A entrada por detrás das ruas principais
onde a morrinha parece que nem molha
e se chega perdido onde se vai.
Não, não é só um beijo que te quero dar.

Quantas vezes nesta hora de desvalimento 
vejo orion e as plêiades devagar no céu de inverno. 
Mas hoje 
com a calma inesperada de chuvas que não cessam 
acordo já depois. Caí numa hibernação que não norteia 
o desequilíbrio do sentimento. 

Espelhos sem paz tocam-nos no rosto. 
Na cega mancha de roupagem aconchego 
cada intempérie com sua mentira 
e depois sigo pela torrente, pelo enredo 
dos outeiros, cada espelho continua 
a caução pacificadora do engano. 
É isso que te levo, isso que me dás 
quando dizes, já sem o dizeres, eu amo-te. 

Pela berma da humidade cerrada 
um risco de mercúrio trespassa. 
Na gravilha passos que não há 
esmagam a música que ninguém escuta. 
Sabiam de cor tudo o que falhava, 
a insónia repentina, o entorpecimento. 

Ouve a espessura dos nervos, a sua câmara 
de conchas escavadas, a roseira azul do vime, 
pastos químicos que transformam 
o gradeamento acolhedor detrás do cérebro 
na fauce lacerada 
por onde o alibi imóvel parece fugir. 

Ao lado cantam os arpões. 
Eu passo com as mãos no seu cabelo. 
E o passado é um tempo que não passa 
em cada uma das dores que me pertence 
e me roubaram. 

Aquele que tem fome desconhece 
o alimento, pede apenas folhas, 
a farinha de um vestuário com uso 
e desmedido. 
Mas o que sempre comeu 
não sabe os caminhos que sangram 
e um dia a morte só lhe trará terror. 

Acordei cansado com os sonhos. 
O rosto que foi amado e se perdeu 
cintilava na roldana de corrente cega, 
a floresta em carvão acorrentava 
o pavor agrícola da pobreza, 
e dentro do sonho um sonho mais disforme 
mãos que sabiam sempre agarrar tudo 
o que não fosse qualquer outra mão. 

Sorria para o asfalto. Com o casaco 
desabotoado e o embrulho em cima da carrinha. 
As nuvens corriam pelo chão de aguaceiro. 
Findavam para si minúsculas assombrações. 
Correu a mão sobre a testa, ergueu 
o cabelo que fervia. 
Vi-o inclinado sobre nada, 
o pó fazia goma nos seus pés, 
estava eu defrontado com um vulto 
entregue à felicidade. 

Quando me viu levou o embrulho 
para o banco de trás e trancou as portas. 
Tinha a cara azul, os olhos de vinho antigo, 
fez-me um sinal desconhecido 
antes de reabrir a porta e me fechar 
na cidade inteira onde já não existia. 

Um fato de flanela cai muito bem 
numa tez esguia, batida pela neblina. 
Cortei-lhe as calças com a lâmina pequena 
e guardei a maior para a suavidade tardia 
junto do empedrado 
onde num clamor sem verdade 
o morto caminho de volta diz 
tristes de todas as coisas. 

Os braços por cima do seu tronco 
a lua nova as constelações o ruído da terra 
um vivo círculo mortal em seu redor. 

(Alta Noite em Alta Fraga, 2001)



Maus Fígados

O Presidente da República foi ver o local onde um sem-abrigo encontrou um recém-nascido. Não só visitou o local, como falou com o dito sem-abrigo. Com um batalhão de jornalistas a testemunharem.
Desconheço se foi visitar o recém-nascido.


sábado, 9 de novembro de 2019

Ka Baird









Por norma, o som da flauta é-me irritante, mas Ka Baird é irresistível no tratamento que faz desse instrumento. E há muito mais.


Respires (2019)

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

Sword of Doom














A luta com os outros, a luta consigo próprio.


Sword of Doom (Kihachi Okamoto, 1966)


terça-feira, 15 de outubro de 2019

sábado, 8 de junho de 2019

Hugo Williams

Ontem veio no correio-e (da F&F):


 The Deal

If you feel like a change
you can swap your present condition
for a case of dizziness,
bed for breathlessness,
cramps for unconsciousness.
You can lower your blood pressure
in return for a sick headache,
bore yourself to death
watching wheels going round,
or die of blood poisoning.

When you’ve cut some sort of deal
with the laws of nature
and passed another day on your back,
you can totter out of there
in thrall to the velvet hour,
sensing around you
the promise of night-scented streets
and the recklessness of summer.
You wonder what you would give
in exchange for this.

Force of Evil













A força da tentação e do sangue.


Abraham Polanksy (EUA, 1948)


aqui.

Maus Fígados

Apresentadora no programa de televisão: "Convidei a actriz X, lindíssima, para vir...".
Suponho que será chocante se, um dia destes, alguém disser "Convidei a actriz X, inteligentíssima, para..."

domingo, 28 de abril de 2019

Nurse with Wound



The Sylvie And Babs Hi-Fi Companion (1985)

I Walked with a Zombie




Um plano belíssimo de uma praia, o céu profundo, por onde se espalham manchas brancas; será, talvez, um fim de tarde de verão. Duas pessoas passeiam à beira-mar, uma silhueta altíssima e outra mais pequena, e uma voz offfeminina que introduz o flashbackque constitui o filme. 
Um antes e um depois.
Estabelece-se um contraste em tempos meteorológicos e geográficos: a quietude  da praia, o clima quente da ilha Saint Sebastian, nas Caraíbas, com a neve que cai em Otava. Uma jovem enfermeira, Betsy, que aceita trabalho onde há palmeiras:  “Palm trees”, diz ela, em eco, enquanto o plano se fecha em fade outao negro. 
Um barco, o mar cintilante ao luar, as estrelas, Betsy e Paul Holland, o seu empregador: nada é o que parece, “everything seems beautiful because you don’t understand”, afirma ele. Este pedaço de terra está morto. Morto como o coração dele, enterrado no corpo de um vivo. E mais mortos-vivos: o seu meio-irmão, Wesley, que ama uma mulher morta-viva, que ama a mulher do seu meio-irmão - ambos em conflito, o mais velho, circunspecto, o que governa a família e o seu negócio, o mais novo, o que bebe. Ambos com feridas por fechar, um que ama a mulher que o outro amou. E Jessica, em profundo estado letárgico, após uma febre inexplicável, submersa no silêncio que envolve o seu corpo. 
Chegada à ilha, Betsy vai encontrar uma terra de ilusões, onde a paisagem idílica esconde a turbulência do que permanece oculto, onde forças opostas se digladiam, onde realidade e ficção se misturam. Na bela casa colonial de Paul Holland, no jardim, encontra-se uma figura retirada da proa de um navio negreiro: os negros chamam-lhe Ti-Misery, São Sebastião sob o martírio das flechas, para que ninguém esqueça de onde veio a fortuna da família e a que custo. 
Na bela casa colonial de Paul Holland o sol permanece no exterior, as sombras no interior; a oposição luz/sombra espalha-se pela casa, as linhas horizontais dos estores projectam-se sobre as pessoas, as paredes, os móveis: barras que encarceram as personagens em luta consigo próprias. E no exterior da habitação, o luxuriante jardim também espalha as suas sombras, dia e noite. Apesar de todas as aparências em contrário, este é um mundo fechado (e é uma ilha, não esqueçamos), onde forças misteriosas se encontram à espreita. I Walked with a Zombiepode ser uma série B, mas, apesar disso, ou por causa disso, tudo é representado com uma subtileza notável (veja-se, por exemplo, a forma como é criado o “terror” a que o título, de forma hiperbólica, alude). O que se insinua, o que fica não-dito revela-se um poderoso modo de instilar inquietação e medo, uma demonstração assombrosa de como utilizar os (parcos) recursos materiais e os (muitos) recursos criativos de que Tourneur e Lewton (realizador e produtor) dispunham.


As sombras são amplificadas pelos sons da noite: tambores tribais, um choro de mulher que atrai Betsy. Não se trata de Jessica, que não sai do seu mutismo, mas o choro de uma mãe-criada-negra ao dar vida a um ser que vai viver naquela ilha. Mas é o choro que faz com que as duas mulheres se encontrem: na noite, Betsy de negro, Jessica de branco, Betsy, a enfermeira que veio para tratar a morta-viva, Jessica a que se encontra nas profundezas de um outro mundo.
A tragédia de Jessica e dos Holland já faz parte do folclore local, assim o demonstra um negro que canta, de forma inadvertida, uma história que serve para que Betsy (e o espectador) fique a conhecer o passado da família e da ilha. Quando chamado à atenção de que Wesley se encontra na esplanada, o cantor interrompe-se e vai de imediato pedir desculpa ao senhor branco (e há sempre subjacente uma crítica à escravidão). Mas, mais tarde, quando é já noite e Wesley se encontra em estado inconsciente (da bebida), aquele recomeça a cantar,  a canção já devidamente actualizada com a chegada da enfermeira. A prestação termina de forma abrupta quando surge Mrs. Rand, a mãe de Wesley (e de Paul). Tal como sucedeu com Jessica, Betsy toma conhecimento com aquela por acaso.  Em segundo plano, ausente do que nos é dado ver (como muito no filme), esta já se inteirou do que Betsy representa para a vida de todos e, sobretudo, para a de Paul: por esse motivo, que  peça ao filho para mandar tirar a garrafa de whiskey da mesa de jantar. Ele recusa, mas ao jantar a garrafa já não está lá. Wesley irrita-se, mas Paul não volta atrás. E eis-nos perante um dos eixos do filme: o amor. Paul toca piano numa sala que o isola dos outros (e é filmado de costas) – Betsy entra no mundo dele, mas ele, após um breve baixar de armas, recompõe-se e pede-lhe para sair (e ouvem-se os tambores). Ela ama-o, confessa-o ao mar, o mar que a trouxe e onde conheceu Paul. Betsy não esquece que ele é casado; a sua felicidade será fazê-lo feliz ao curar Jessica. 






Mas, por agora, chega de amor. Eis-nos na noite do vodu. Alma, uma das criadas da família, fala a Betsy de poderosos poderes sobrenaturais. E a enfermeira decide tentar – afinal, o que pôde a ciência? Pelo meio dos canaviais, seguindo o caminho assinalado por estranhos objectos e guardado por um gigante negro chamado Carrefour (simbólico, não?), também ele em estado letárgico. O vento sopra, imaginamos que quente, doentio, os tambores tocam (e tocam várias vezes durante o filme, uma presença em surdina, à espreita), percurso e cerimónia, duas das sequências mais belas do filme. (Já mencionei o belo preto e branco?) O deus vodu fala por Mrs. Rand, escondida atrás de uma porta. E os nativos cortam o braço de Jessica: com espanto, verificam (e nós também) que ela não sangra. Betsy salva Jessica do sumo sacerdote vodu, que, tendo-a tido uma vez, a quer para sempre.
E eis que surge a inevitável questão: o que aconteceu, exactamente, a Jessica? O que éJessica? E como libertá-la? Ninguém sabe, excepto o sacerdote vodu e Wesley. Há uma faca e uma flecha de São Sebastião. E há o mar,  onde Wesley e Jessica se banham, alcançando, por fim, a liberdade que nenhum alcançou neste mundo. 
O que pode o amor de Betsy e de Paul perante isto? Nada.


I Walked with a Zombie, Jacques Tourneur (EUA, 1943)


Daffy Duck














terça-feira, 16 de abril de 2019

Sophia de Mello Breyner Andresen

Quando


Quando o meu corpo apodrecer e eu for morta 
Continuará o jardim, o céu e o mar, 
E como hoje igualmente hão-de bailar 
As quatro estações à minha porta. 

Outros em Abril passarão no pomar 
Em que eu tantas vezes passei, 
Haverá longos poentes sobre o mar, 
Outros amarão as coisas que eu amei. 

Será o mesmo brilho, a mesma festa, 
Será o mesmo jardim à minha porta, 
E os cabelos doirados da floresta, 
Como se eu não estivesse morta. 


Dia do Mar (1974)


Fennesz



Agora (Touch, 2019)

domingo, 31 de março de 2019

Pere Ubu


The Modern Dance (1978)



Dub Housing (1978)




Paulo da Costa Domingos

MUSGO

Toda a noite a tília
chora sua mágoa de água,
que gela, toda a noite
indiferente.

Acerca da noite ignora-se
se é uma benção ou mera
coincidência o dia
seguinte.


A Vau (Companhia das Ilhas, 2018)

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Patti Smith





Gloria

Jesus died for somebody's sins but not mine
Meltin' in a pot of thieves
Wild card up my sleeve
Thick heart of stone
My sins my own
They belong to me, me
People say "beware!"
But I don't care
The words are just
Rules and regulations to me, me
I-I walk in a room, you know I look so proud
I'm movin' in this here atmosphere, well, anything's allowed
And I go to this here party and I just get bored
Until I look out the window, see a sweet young thing
Humpin' on the parking meter, leanin' on the parking meter
Oh, she looks so good, oh, she looks so fine
And I got this crazy feeling and then
I'm gonna ah-ah make her mine
Ooh i'll put my spell on her
Here she comes
Walkin' down the street
Here she comes
Comin' through my door
Here she comes
Crawlin' up my stair
Here she comes
Waltzin' through the hall
In a pretty red dress
And oh, she looks so good, oh, she looks so fine
And I got this crazy feeling that I'm gonna ah-ah make her mine


Horses (1975)




Edwin Smith